quarta-feira, 31 de março de 2010

De olho na Copa, Ministério da Justiça quer fim de armas em jogos

Vasconcelo Quadros , Jornal do Brasil

BRASÍLIA - O ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, afirmou segunda-feira que o governo federal vai pressionar os estados e clubes a mudarem a forma de policiamento nos estádios de futebol em todo o país para conter a violência policial contra torcedores e, ao mesmo tempo, executar um combate mais eficaz aos distúrbios. A leitura do governo é que o uso de armas letais ou mesmo o emprego de cassetetes que causam mortes ou traumatismos graves são sintomas de despreparo para lidar com distúrbios públicos.

– A polícia não deve portar nenhum tipo de arma letal dentro ou nas imediações dos estádios – afirmou o ministro, que criticou o despreparo da Polícia Militar para lidar com baderneiros que, segundo ele, podem ser contidos sem o excesso de violência que normalmente se verifica quando a polícia, sem as técnicas ou equipamentos adequados de ação, parte para o confronto direto com torcedores.

As ações violentas demonstram, segundo o ministro, que é necessário investir no treinamento de policiais e na aquisição de equipamentos para a contenção dos distúrbios. Ele citou os confrontos entre polícia e torcedores no Estádio Couto Pereira, em Curitiba, no final do ano passado, os frequentes duelos entre torcidas em São Paulo e, no mês passado, uma ação despreparada da PM de Brasília, que jogou a cavalaria contra torcedores na saída do Estádio Serejão, em Taguatinga, ferindo gravemente um jovem de 17 anos. No final do ano passado, depois de uma partida entre São Paulo e Goiás, no Bezerrão, em Brasília, um PM deu uma coronhada de revólver na cabeça de um torcedor. A arma disparou e o rapaz morreu.

Campeonato

O novo plano de policiamento nos estádios será discutido com autoridades de segurança dos estados e com dirigentes de clubes de futebol para ser posto em prática já no Campeonato Brasileiro deste ano, previsto para começar em maio. O objetivo, segundo Barreto, é começar a preparar agora a estrutura de segurança que será empregada na Copa do Mundo de 2014.

Além de equipamentos não letais e policiais com treinamento especial para conter distúrbios públicos, os estádios também deverão adaptar suas estruturas para evitar aglomerações e facilitar o uso de policiamento descaracterizado entre os torcedores. Equipamentos eletrônicos de monitoramento, como câmeras de TV, devem ser estendidas para áreas fora dos estádios a fim de permitir que a polícia acompanhe e possa agir preventivamente cada vez que surgir um foco de conflito.

O ministro da Justiça disse ainda que o novo modelo poderá ser inspirado no projeto desenvolvido na Copa do Mundo da Alemanha.

– Visitei os estádios. Além de rampas móveis que evitam aglomeramentos, eles têm até delegacias com policiais, promotores e juízes dentro do estádio – observa Barreto. Segundo as estatísticas, 42 torcedores morreram nos últimos dez anos vítimas de guerras entre torcidas organizadas ou no confronto com policiais. No ano passado, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que pune com pena de um a dois anos quem promover ou incitar tumulto nos estádios.

Brigas saem da arquibancada e vão para os arredores

Criado em 1991, extinto quatro anos mais tarde e reativado em 1999, o Grupamento Especial de Policiamento em Estádios (Gepe) é o responsável por toda a segurança em dias de jogos. Ainda que sua presença não seja suficiente para erradicar os confrontos entre torcedores, as brigas e confusões tão comuns nas arquibancadas em um passado próximo passaram a se concentrar dos portões para fora. Mapeando e identificando as principais lideranças das torcidas de cada clube, além de suas subdivisões, o Gepe passou a responsabilizar as próprias organizadas pelos tumultos. Além disso, o grupamento é responsável por acompanhar o deslocamento de cada organizada em direção ao Maracanã ou ao Engenhão.

– A gente tem trabalhado para se aproximar cada vez mais das torcidas. Existe um canal aberto para troca de informações – explica o comandante do Gepe, o tenente-coronel Luís Otávio. – Nos clássicos, fazemos reuniões com os líderes, com representantes dos clubes e das federações e ainda com PMs dos batalhões da área. Acompanhamos os torcedores desde o seu ponto de partida até a chegada.

O desafio agora é eliminar confrontos em pontos distantes. No domingo, um torcedor do Flamengo foi baleado em São Gonçalo, por torcedores do Vasco. Maycon Marins da Silva, de 16 anos, está internado no Hospital Azevedo Lima, em Niterói, em estado grave.

– Estamos avançando ainda mais. Não estamos mais restritos aos líderes. Procuramos conversar também com os integrantes das organizadas, que são divididas em vários grupos – explica.

Sobre o projeto para que o policiamento de estádios seja feito sem armas de fogo, o comandante acredita que o uso de armamento é necessário para acompanhar cada grupo de torcedores.

– Nós já trabalhamos com policiais desarmados nos estádios. Porém, os que acompanham o deslocamento das torcidas, e isso justifica o porte de arma, não têm como voltar até o batalhão para deixar a arma e retornar para o estádio – disse o tenente-coronel. – Mas, se isso for aprovado, a gente vai ter que se adaptar.

Ausência de armas divide os torcedores no Rio

Thiago Feres

A possível proibição do uso de armas de fogo pelos policiais militares de todo o país, no patrulhamento no entorno de estádios de futebol, dividiu os torcedores cariocas. A violência das torcidas organizadas é o principal argumento para a manutenção de armamentos, como fuzis. Atualmente, o policiamento se utiliza apenas de pistolas na parte interior dos estádios.

– Não vejo como a Polícia Militar conseguir intervir em um confronto de torcedores sem estar armada – avalia o economista Carlos Alexandre de Morais, freqüentador assíduo dos jogos do Flamengo no Maracanã. – O policial não usa a arma sempre, mas sabe que ela está lá, o que ajuda a ele ser respeitado pelos torcedores vândalos. Sem armamento, acho incontrolável a situação em grandes jogos.

No entanto, há quem considere desnecessário o uso de armamentos pelos policiais, mesmo em dias de grandes clássicos.

– Quanto mais armas, menor é o número de famílias nos estádios - opina o publicitário João Henrique, 25. – É possível controlar as possíveis confusões sem o recurso bélico.

Sobre o caso, a Polícia Militar do Rio afirmou que só irá se pronunciar quando o projeto for votado. Além da possibilidade dos policiais ficarem desarmados, a Secretaria de Segurança Pública do Rio também estuda a possibilidade de cobrar pelo policiamento em dias de grandes jogos de futebol ou shows de grandes proporções.

O secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, encaminhou à PM um estudo sobre o assunto, solicitando, entre outras coisas, o quantitativo de homens, viaturas, cavalos e cães, além de toda a infraestrutura de um evento esportivo. O documento já ficou pronto e está sendo analisado pelo Departamento Jurídico da Secretaria de Segurança para obter o parecer legal. Em viagem aos Estados Unidos, Beltrame não comentou o caso.

– Sabemos que os policiais não são remunerados como deveriam ser, mas a questão é que estaremos pagando pelo mesmo serviço duas vezes – analisa o consultor de projetos, Eduardo Argollo, outro que sempre vai aos jogos do Flamengo.

O ex-comandante do Grupamento Especial de Policiamento em Estádios (Gepe), major João Busnello, também defende que o serviço seja pago, mas questiona a ausência de armas pelos policiais no entorno dos estádios.

– São agentes públicos que atuam dentro de uma área privada, por isso, deveriam ser remunerados – revela. Sobre as armas, elas são utilizadas pelos policiais com dois objetivos: a sua própria defesa e a defesa de outro. As partes externas dos estádios são vias públicas. Nós podemos e devemos aumentar a parte educativa da população e o treinamento dos policiais, mas as armas fazem parte dos agentes. De qualquer forma, a legislação foi feita para ser cumprida. Se aprovado, acataremos a determinação.

Retirado de: http://jbonline.terra.com.br/pextra/2010/03/29/e290320689.asp

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