BRASÍLIA - O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidirá nesta terça-feira se juízes podem proibir menores de 18 anos de sair às ruas entre as 23h e 6h. Os conselheiros julgarão seis casos juízes de Varas de Infância e Juventude que instituíram o chamado toque de recolher em suas cidades sob a justificativa de proteger crianças e adolescentes.
Adotado por juízes de diversas cidades de interior no País desde o começo do ano, o toque de recolher rendeu polêmica. No CNJ, a posição é bem dividida. Há dois meses, o Conselho suspendeu a portaria do juiz de Patos de Minas (MG) que proibia a circulação de menores desacompanhados ou sem a autorização dos pais. Como nem todos os conselheiros estavam presentes à sessão e o placar foi apertado, com diferença de apenas um voto, o quadro pode mudar.
Parte dos conselheiros entende que a proibição é legal e tem base no próprio Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). De acordo com o ECA, o juiz pode disciplinar, por meio de portaria, a participação de menores em eventos públicos e a permanência deles, sem os pais, em determinados locais. Logo, também pode restringir sua circulação. Quem está do outro lado sustenta que o juiz só pode proibir os menores de entrar em lugares determinados, mas não impedi-los de circular genericamente.
O relator dos processos no CNJ é o ministro Ives Gandra Filho. Para ele, o Conselho deve julgar os casos com os olhos na realidade. “Não podemos simplesmente desautorizar um sistema que vem funcionando com o respaldo da população local e que ajudou a reduzir as infrações cometidas por menores, sem dar uma alternativa ao juiz”, afirmou. Levantamento em algumas cidades mostrou que o índice de crimes envolvendo menores caiu até 80% com a proibição de saírem de madrugada.
A defesa das portarias encontra ressonância em alguns setores sociais. Conceição Paganele, presidente da Associação de Mães e Amigos da Criança e do Adolescente em Risco (Amar), defende a proibição. “É triste que a Justiça deva chegar a esse ponto, mas crianças e adolescentes não devem sair às ruas de madrugada sem os pais”, afirma.
A maioria das entidades e organismos de proteção de crianças e adolescentes, contudo, condena as medidas. Para o advogado Ariel de Castro Alves, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), a proibição é “ilusória, demagógica, oportunista e não visa resolver os problemas das crianças, mas sim escondê-los”.
Em julho, o Conanda encaminhou ao CNJ um parecer atacando as portarias. “O ECA não permite que as portarias judiciais sejam genéricas. Elas precisam ser específicas. Por exemplo, proibindo a entrada de menores sem os pais em certos locais. Portarias genéricas dão margem a todo tipo de abuso de poder”, diz Alves. Para o advogado, é preciso reestruturar conselhos tutelares, criar delegacias especializadas em infrações de crianças e adolescentes e colocar em prática as políticas públicas previstas em lei. “Não basta trancar os jovens em casa”, diz.
Na sessão desta terça, o CNJ julgará a restrição à circulação de menores instituída nas cidades de Itajá (GO), Nova Andradina e Anaurilândia (MS), Santo Estevão (BA), Fernandópolis (SP) e, novamente, Patos de Minas (MG). Mas a decisão terá reflexos futuros em todas as cidades que adotam a medida.
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