domingo, 10 de janeiro de 2010

Ministério Público Federal apura atuação de sargento do Exército em torturas em Ribeirão Preto na época da ditadura militar

Passado a limpo

Anos de chumbo Ministério Público Federal apura atuação de sargento do Exército em torturas em RP na época da ditadura militar

GUTO SILVEIRA
Gazeta de Ribeirão
antonio.silveira@gazetaderibeirao.com.br
O Ministério Público Federal em Ribeirão Preto instaurou, no final dezembro passado, inquérito civil para apurar prática de tortura contra presos políticos na cidade no período da ditadura militar (1964-1985). O investigação tem prazo inicial de um ano e foi provocada por representação do ex-vereador Leopoldo Paulino (PMDB). O ex-parlamentar foi procurado, mas não quis falar com a Gazeta.
Em princípio, a apuração deverá ser centrada no sargento do Exército Dílson Luiz Salles, que também era engenheiro civil tendo inclusive cursado três anos da faculdade em Ribeirão Preto. Hoje ele estaria morando no Espírito Santo. Salles não foi localizado pela reportagem.
O procurador da República Carlos Roberto Diogo Garcia, responsável pelo inquérito, já solicitou informações a entidades e órgãos públicos para saber como era a atuação do sargento. Também enviou carta precatória para que o acusado seja ouvido.
PASSADO TRISTE. Duas pessoas que tinham militância na esquerda e que foram torturadas na época da ditadura dizem nunca ter tido contato com o sargento agora investigado.
O advogado Vanderley Caixe, hoje com 66 anos, e a enfermeira Áurea Moretti, 65, foram levados quando tinham 25 e 24 anos, respectivamente, em 1969, período de maior repressão da ditadura, para o prédio onde hoje funciona a Delegacia Seccional de Polícia, antiga sede da Força Pública.
Caixe conta que as torturas eram realizadas pela Operação Bandeirantes (Oban), por um batalhão da Aeronáutica de Pirassununga, agentes do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) e do Departamento de Ordem Política e Social (Dops).
Ele se lembra muito dos delegados Miguel Lamanno e Renato Ribeiro Soares, esse último, à época, delegado Seccional de Ribeirão Preto. "Fui muito torturado porque eles não acreditavam que era eu o chefe do grupo, por ser muito novo", disse o advogado.
Áurea Moretti disse que as torturas tinham também a participação da Guarda Civil e do Corpo de Bombeiros. "Era interrogatório e tortura dia e noite. Pau de arara, choque elétrico e espancamento. Muitos morreram ou enlouqueceram", afirmou. Ela aponta que os choques eram aplicados em todo o corpo, preferencialmente nas partes íntimas das mulheres. "Também havia assédio moral e sexual. Foi um horror."
Torturados ficaram até 5 anos presos
O advogado Vanderley Caixe, 66 anos, e a enfermeira Áurea Moretti, 65, quando foram presos participavam da luta armada e foram condenados à prisão. Áurea pegou seis anos, mas a pena foi reduzida para 4,5 anos e ela cumpriu pouco mais de três anos. Caixe teve pena inicial de dez anos, que foi reduzida para seis e ele cumpriu cinco. Depois que deixou a prisão, Áurea terminou o curso de Enfermagem na USP, mas não conseguia emprego. "Minhas colegas tinham até quatro empregos, se quisessem. Eu não tinha um", conta. Sem alternativa, ele teve que ir para o Acre, onde trabalhou na Universidade Federal e, depois, trabalhou na PUC, de Campinas. "Mas ninguém podia saber da minha condição de ex-presa política. Senão a demissão era por justa causa." (GS)
Ex-seccional diz não ter participado
O ex-delegado Renato Ribeiro Soares, hoje aposentado e com 83 anos, disse que nunca participou de torturas de presos políticos da ditadura militar. "Também nunca mandei torturar ninguém", afirmou. Mas conta que chegou em Ribeirão Preto no pior período da repressão. E até reconhece que ocorreram excessos na época. Ele afirma que os responsáveis pelos interrogatórios e torturas, na época, eram os militares e o pessoal do DOI-CODI e do Dops. "Eu era o titular da Seccional, mas não era quem resolvia. Se não fiz melhor, foi porque fui incapaz. Mas sempre trabalhei com muita seriedade.”
O ex-delegado Miguel Lamanno não quis falar com a reportagem. A esposa dele, que atendeu ao telefone, disse: "Essa época já passou. O povo já morreu e reencarnou." E desligou o telefone em seguida. De Dílson Luiz Salles nenhum contato foi encontrado. (GS)

Retirado de: http://www.gazetaderibeirao.com.br/conteudo/mostra_noticia.asp?noticia=1669649&area=92020&authent=60BD218E88CA90D9042A15187329D2

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