terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Guarda Civil, Polícia por Direito?

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1.1 Guarda Civil, Polícia por Direito?.

1.2 Poder de Polícia..

1.3 Da análise Constitucional.

1.4 Da interpretação do Código de Processo Penal.

1.5 Da Gratificação por Regime Especial de Trabalho Policial (RETP)

1.6 conclusão.

1.1 Guarda Civil, Polícia por Direito?

Ainda hoje, é muito comum ouvirmos em discussões pelas ruas ou mesmo em abordagens feitas por guardas civis, o questionamento trivial e corriqueiro de que o Guarda Civil não é policial, e logo, não tem a autoridade de efetuar abordagens, revistas pessoais ou revistas em veículos.

Quem nunca ouviu ou mesmo falou que Guarda Civil não é polícia. É com base nessa indagação que iremos estudar e analisar alguns pontos para tentar sanar essa dúvida e chegar a uma conclusão sobre o tema.

É de estrema importância, ao fazer uma abordagem dessa natureza, primeiramente, definir e conceituar o que é o poder de polícia.

1.2 Poder de Polícia

Este poder vem das antigas Polis gregas, derivados de polis (cidade), que originaram a política e a polícia. Assim sendo, polícia neste caso, significa o bem comum, podendo ser sacrificado o direito individual em prol do direito (bem comum) e da polícia (derivada de civilização/civilidade).

Os Estudiosos do Direito do século XVIII, já conceituavam o poder de polícia, como sendo a "Atividade estatal que limitava o exercício dos direitos individuais em beneficio da segurança".

Alguns dos doutrinadores do Direito Administrativo conceituavam de modo geral, que o poder de policia, "É a atividade do Estado consistente em limitar o exercício dos direitos individuais em beneficio do interesse publico".

Quando falamos de polícia, nos referimos a todo o Estado e não apenas à Administração Pública, em um sentido mais lato é a Faculdade que tem o Estado, mediante lei, de restringir a liberdade e direito individual em prol do interesse de uma coletividade.

A Administração impõe restrições (não fazer), limitando as liberdades e usos, com um caráter negativo, por restringir.

Na Lição do saudoso e festejado Mestre Hely Lopes Meirelles, "Poder de Policia é a faculdade de que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado".

Apesar do poder de polícia, a qual é o foco deste estudo, ser um poder de polícia mais específico, conceituado por Hely Lopes Meirelles de Poder de Polícia de Manutenção da Ordem Pública, não podemos nos esquecer que a espécie faz parte do gênero e não o inverso.

Logo, vemos que a razão de existir do poder de polícia, se baseia na função da supremacia do interesse público sobre o privado, mantendo assim a ordem pública e o bem estar de todos. É claro que alguns estudiosos do direito poderiam indagar sobre a conceituação proposta, e dizer que "o gênero de poder de polícia de repressão contra os atos delituosos não se enquadra no conceito de poder de polícia da administração", no entanto seria um pouco ingênuo tentar desvincular a espécie do gênero, pois o conceito se baseia nas mesmas condições e por ordenamentos e princípios constitucionais que em seu intento busca as mesmas finalidades de modos diferentes, ou seja, a manutenção da ordem pública, o interesse coletivo e a paz social.

No Código Tributário Brasileiro, encontramos o conceito técnico, ou melhor, dizendo, o conceito legal, de Poder de Polícia:

Art. 78 Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente a segurança, a higiene, a ordem, aos costumes, a disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividade econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, a tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais e coletivos.

Nessa mesma linha de raciocínio, qual é a finalidade da Polícia Militar, senão tentar garantir a tranqüilidade social, a manutenção da ordem pública? E como a própria Polícia Militar de São Paulo, preceitua como lema: "Nos, Policiais Militares, Estamos Compromissados Com A Defesa Da Vida, Da Integridade Física E Da Dignidade Da Pessoa Humana". Então fica claro que não podemos deixar de lado a conceituação de poder de polícia em seu gênero para tentar chegar a uma finalidade do que seria o poder de polícia do Estado.

Observando dessa mesma maneira é verificado que a mesma finalidade que busca as diversas espécies de polícias, buscam as Guardas Civis, pois, fica muito evidente, quando da análise do lema da Guarda Civil Metropolitana do Município de São Paulo, estampado pelas suas bases e preceituando que: "Guarda Civil amiga leal e protetora".

1.3 Da análise Constitucional

Reza o artigo 144 da Constituição Federal

Art.144.

A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I - polícia federal;

II - polícia rodoviária federal;

III - polícia ferroviária federal;

IV - polícias civis;

V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.

Para alguns autores, o rol estabelecido neste artigo é taxativo e não exemplificativo, entretanto, sem entrar no mérito de ser o rol taxativo ou exemplificativo, as Guardas Civis, estão onde deveriam estar, no capítulo da Constituição que trata da Segurança Pública.

§ 8º. Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.

Ora, nesse momento alguns estudiosos do direito, poderiam afirmar, "então a matéria está pacificada pela própria constituição federal, que já definiu a atuação das Guardas Civis", entretanto, peço venia aos estudiosos que fazem tal interpretação simplesmente gramatical e sistemática, para discordar, pois, o que seria a proteção de seus bens e serviços, senão das pessoas que ali trabalham, dos munícipes que utilizam os serviços das prefeituras? Se pensássemos de forma diferente poderíamos já concluir que os Guardas Civis estão ali apenas olhando para os prédios vazios, árvores e monumentos pelas ruas.

É óbvio que esta não foi à finalidade do legislador quando preceituou a condição para os municípios da criação de Guardas Municipais, pois tratou do assunto em cápitulo que disciplinava a Segurança Pública, ou seja, caso fosse necessário, em alguns municípios seriam criadas as Guardas Municipais, para auxiliar na preservação da ordem pública, junto às policiais militar e civil. Tanto foi esta a intenção do legislador que, é público e notório, que em alguns municípios de Estados brasileiros de menor complexidade, não foram criadas Guardas Municipais, tendo em vista o baixo índice de criminalidade.

1.4 Da interpretação do Código de Processo Penal

O código de Processo Penal é um instrumento que em muito ajuda a sanar a dúvida, que é motivo de muita discussão acadêmica, principalmente no direito castrense. Fazendo então um exercício mental, poderemos chegar a algumas contradições quando se afirma que o Guarda Civil, não é policial.

No artigo 301 do Código de Processo Penal, esta disposto que:

Art.301.

Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.(grifamos)

Nesse sentido, imaginando que A, estava matando B na rua e de outro lado encontrava-se estacionada uma viatura da Guarda Civil, com dois agentes, pergunta-se: seria fato típico do artigo 319 do código penal ou até mesmo a combinação com o artigo 13, parágrafo segundo do mesmo diploma, que os guardas civis, que viram a conduta de A matando B, o deixarem sair sem tomar qualquer atitude ou mesmo prendê-lo?

Para responder essa pergunta, primeiro é necessário saber se o Guarda Civil é agente de polícia ou não, pois se for entendido que não, poderiam os guardas simplesmente olhar a conduta de A matando B, e sair com sua viatura sem nada fazerem, pois, a questão da prisão ficaria a seu livre arbítrio?

Estabelece o artigo 13 parágrafo 2° do Código penal:

Relação de causalidade

Art.13.

O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.

Relevância da omissão

§ 2º. A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:

a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância;

b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado;

c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.

Determina o artigo 319 do Código Penal

Prevaricação

Art.319.

Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal:

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.

Verificando a situação hipotética e fazendo uma análise dos dispositivos penais, são sujeitos ativos dos tipos penais os guardas que deixaram A sair sem o prendê-lo ou mesmo tentar evitar o homicídio, pois, pensar de forma diversa, seria no mínimo um absurdo, ferindo princípios como da Dignidade da Pessoa Humana, Legalidade e Moralidade dos atos dos agentes públicos e até mesmo falta de zelo com a destinação do dinheiro público, uma vez que é investido milhões de reais, em viaturas, armas, treinamentos e simplesmente ficaria a critério do guarda agir ou não, como que se não tivesse o dever legal de evitar o crime.

1.5 Da Gratificação por Regime Especial de Trabalho Policial (RETP)

É de conhecimento no meio policial o jargão que "O Policial tem hora para entrar de serviço, só que não tem hora certa pra sair".

Essa frase feita, mas de grandes conseqüências, mostra um pouco da vida estressante e corrida dos policiais.

É certo que nenhum policial no Brasil, ganha qualquer remuneração a mais por passar da hora de sair de serviço, ou como dizem no direito trabalhista não tem o direito à hora extra, e é exatamente por causa do RETP, que o policial não recebe remuneração por horas extras prestadas em suas atividades, pois por ser uma função que necessita de atenção e dedicação máxima, é pago aos policiais além de seu salário e benefícios, é pago também um adicional extra, chamado de Regime Especial de Trabalho Policial, o que o torna remunerado, mesmo que estando de folga, por seu trabalho policial, seria como um plus, uma vez que o RETP é a metade do salário base do policial que compõe sua remuneração.

Pensado que os Guardas Civis[1] recebem o RETP, não sendo considerados policiais, por alguns estudiosos, não seria o caso então de uma ação por parte do Ministério Público contra a prefeitura que pagasse tal beneficio? Afinal de contas estão gastando dinheiro público indevidamente então não seria cabível a responsabilidade do Ministério Publico que estaria nesse caso sendo omisso com o interesse da população?

Mas felizmente não é assim a questão e por isso não há intervenção do órgão ministerial, pois o pagamento do RETP ao Guarda Civil é pago devidamente, pois ele exerce a função de policial e deve receber por aquilo que trabalha, agora caso o contrário estaria o Guarda Civil sendo lesando por exercer uma atividade de risco e insalubre e não receber por isso, pois é comum, que Guardas Civis se depararem com ocorrências, ficando por horas além de seu turno nas delegacias de polícia acompanhando a lavratura de autos de prisão em flagrante.

Para não restar dúvidas quanto à legalidade do recebimento de RETP pelos guardas civis, peço venia mais uma vez para invocar a lição do saudoso mestre Hely Lopes Meirelles que ensina que:

"Cargo Público é o lugar instituído na organização do serviço público, com denominação própria, atribuições especificas e estipêndio correspondente, para ser previsto e exercido por um titular, na forma estabelecida na lei".

"Função é a atribuição ou conjunto de atribuições que a Administração confere a cada categoria profissional, ou comete individualmente a determinados servidores para a execução dos serviços eventuais".

Persiste o mestre dizendo que:

"Todo o cargo tem função, mas pode haver função sem cargo".

É nesse entendimento que firmo a base para preceituar que o Guarda Civil, se não tem o cargo de policial em nomenclatura, o tem em desígnios, pois exerce sem sobra de dúvidas o húmus público da função policial.

1.6 conclusão

Após fazermos uma pequena análise e ainda que superficial, do Poder de polícia da Guarda Civil, foi possível constatar que o Direito Administrativo, validado pela Constituição Federal, declina essa autoridade às Guardas Municipais, sem que com isso viole qualquer preceito constitucional, pois, independe do fato de alguns estudiosos afirmarem que o rol do artigo 144 da Constituição Federal é taxativo, ninguém em sã consciência jurídica, poderia negar que não existe direito absoluto, (com exceções da clausulas pétreas), logo não há contradição quando dizemos que o texto constitucional abriu esse leque para as prefeituras contribuírem na manutenção do Estado Democrático de Direito.

A tese publicada na Revista Força Policial n° 45/2005 por um membro da Polícia Militar, afirma que há interferência dos órgãos municipais na atividade de segurança pública, e deixa de lado atividades de cunho social, chegando a afirmar em sua tese que existe gasto desnecessário das prefeituras com os membros das Guardas Civis, sustentando a tese de que a mesma função poderia ser efetivamente efetuada pela Polícia Militar. E mais, afirma em certo momento até mesmo a questão da Lei da Responsabilidade Fiscal, esquecendo-se, entretanto que esta lei, também é valida em nível estadual e federal.

Propõem ainda o policial militar nesse trabalho, a possibilidade de atuação das Guardas Civis, sob supervisionamento da Polícia Militar, o que seria uma verdadeira discrepância jurídica, tendo em vista a interferência de esferas de poder.

Após ler diversos artigos sobre o poder de polícia das Guardas Municipais, elaborado por membros de outras instituições, chego a triste e lamentável conclusão que existem alguns membros de outras classes de polícia, que vêem a Guarda Municipal, não como uma aliada no combate à criminalidade, mas como um concorrente que roubará a vez nos noticiários policiais, deixando de lado a finalidade da existência da força policial, por capricho "de um irmão mais velho enciumado".

Dizer que as Guardas Municipais, não tem poder de polícia, com todo o respeito a opiniões e teses contrárias, é sem sombra de dúvidas não avistar a imensidão do direito e ficar a estreita de interpretações retóricas e demagogas.

AUTOR: MOISES RESENDE MOREIRA

ADVOGADO OAB/SP 224289

MEMBRO DA Coordenadoria de Cidadania, Ação e Integração SOCIAl da oab/sp.

ESPECIALISTA EM DIREITO PENAL PELA FMU

ESPECIALISTA EM PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DAS POLÍCIAS MILITAR/CIVIL/GUARDA CIVIL

docente ensino superior

advogado militante. NA ÁREA PENAL.

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Um comentário:

  1. Estamos vivenciando um momento muito importante,pois esta chegando mais um ano eletivo e mais uma vez se utilizaram das Guardas Municipais para um trampolim eleitoreiro,ou bases políticas.No entanto devemos reafirmar cada vez mais a importancia das Guardas no contexto da Segurança Pública.A desmilitarização das PMs,sera um, fato confirmado,afinal vivemos um novo momento na democracia e portanto uma nova política de Segurança Pública deve se fazer presente...

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