quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Boletim Informativo IPA – Alerta Geral

 

BOLETIM INFORMATIVO 11/01/2010
ALERTA GERAL


É PROIBIDO PRENDER E INVESTIGAR MAGISTRADOS

Carlos Alberto Marchi de Queiroz (*)

No dia 12 de novembro de 2009, o presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo deu conhecimento à Instituição Policial polêmicas alterações que passaram a viger no Regimento Interno daquele Tribunal.
O artigo 90 desse ato reza que o juiz somente poderá ser preso nas hipóteses previstas no Estatuto da Magistratura ou Lei Orgânica, consoante preceitua o artigo 33, II, da Lei Complementar 35, de 14.3.79.
As surpreendentes mudanças dessa nova ordem começam a aparecer a partir do artigo 91 que trata do recolhimento e da condução do magistrado detido, que, doravante, serão definidos pelo presidente do Tribunal, nada falando sobre a prisão-captura, que poderá ser feita pela autoridade policial, seus agentes ou qualquer pessoa do povo.
O artigo 92 impõe a comunicação imediata do magistrado preso ao presidente do Tribunal ou ao seu vice-presidente, conduzindo-se o detido, ato contínuo e obrigatoriamente, à sua presença ou de desembargador do Órgão Especial designado especialmente para a lavratura do flagrante.
Deste contexto, extrai-se a conclusão de que o delegado de polícia está proibido de concretizar a prisão-autuação, ao arrepio do Estatuto da Magistratura, da Lei Complementar 35, de 14.3.79, do Código de Processo Penal e da própria Constituição Federal.
Ademais, referida alteração colide contra o preceito romano que ensina: ne iudex procedat ex officio, vedando que o magistrado seja juiz e parte ao mesmo tempo.
Causa-nos espécie que o magistrado autuante, em plena fase policial, possa, futuramente, compor o Tribunal Pleno, por ocasião da fase do julgamento.
Ocorrendo a prisão, por exemplo, de um membro do Poder Judiciário paulista nas barrancas do rio Paraná, como conduzir o detido à Capital para formalização da prisão-autuação?
O § 1º, ajustando-se ao CPP, impõe o recolhimento do magistrado em sala especial de Estado Maior da PMESP, a convocação do Órgão Especial no prazo máximo de 48 horas, enviando-se a cada desembargador uma cópia da prisão-autuação.
O § 2º normatiza a subsistência ou não da prisão, com a expedição de alvará de soltura, enquanto que o § 3º repete o Estatuto da Magistratura, obrigando a autoridade policial, civil ou militar, a remeter, imediatamente, ao TJSP os autos de inquérito policial, como acontece corriqueiramente desde 1979, quando emergir dos mesmos indícios de ilicitude penal por parte de integrante do Poder Judiciário, aliás mera repetição do artigo 33, II, da LOMN.
Em boa hora, o § 4º do artigo 92 permite ao Tribunal requisitar o concurso da autoridade policial, civil, para sob sua fiscalização direta, auxiliar nas investigações, principalmente na quebra de sigilo bancário, telefônico ou de dados eletrônicos, sempre dependentes de autorização do Órgão Especial.
O artigo 93 causa perplexidade ao intérprete, uma vez que proíbe, terminantemente, a condução do magistrado a qualquer repartição policial, civil ou militar, após a prisão-captura, cabendo à presidência do Tribunal de Justiça tornar disponível meio de contato imediato, comunicando o fato às autoridades competentes.
Nesse momento crucial, como deverá agir o captor em relação ao capturado, onde mantê-lo custodiado diante do prazo fatal de 24 horas para a lavratura da prisão-autuação?
O parágrafo único do artigo 93 impõe ao condutor o mesmo iter procedimental em caso de prisão civil de magistrado por inadimplemento de pensão alimentícia.
Concluindo, o artigo 94 sujeita a autoridade policial ou os seus agentes a medidas de responsabilização disciplinar e criminal através de providências determinadas pelo presidente do Tribunal de Justiça.
Doutrinária e respeitosamente entendemos que essas modificações afrontam a Constituição Federal de 1988, que confere exclusividade de prisão-autuação aos delegados de polícia, a Lei Orgânica Nacional da Magistratura, de 1979, o Código de Processo Penal, de 1942, e o princípio geral de Direito ne iudex procedat ex officio.
Infelizmente, não se pode recorrer à ADIN, uma vez que o STF não conhece de pedido fundado sobre atos de legislação secundária, e, muito menos, recurso ao Conselho Nacional de Justiça, já que a Polícia Civil é auxiliar de Justiça, enquanto polícia judiciária.
Sugerimos, sub censura, que a Administração Superior promova seminários no âmbito da Polícia Civil e da Polícia Militar, buscando-se uma saída jurídica honrosa, inclusive uma possível revisão dessas modificações por parte do Tribunal de Justiça, que colidem contra o Estatuto Nacional da Magistratura.
Se a moda pegar, brevemente o Ministério Público seguirá esse curioso modelo paulista, que poderá repercutir no Poder Legislativo, proibindo delegados de polícia autuar em flagrante senadores, deputados federais e estaduais.
Entendemos que o debate deve ser profundo na Administração Superior, nos departamentos e em toda a capilaridade da Polícia Civil.

(*) Carlos Alberto Marchi de Queiroz é Delegado de Polícia de classe especial, Mestre em Direito pela USP, professor universitário e na Academia de Polícia. Escreve para a revista O Policial e site da IPA/SP
 

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